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Capítulo 1: Eu, Eu mesmo e Nhanderecó.
Saint-Jean-Pied-de-Port → Pireneus.
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E fui indo, seguindo as plaquinhas “Route Napoléon” avistadas pelo cami- nho, que começou com uma subida muito íngreme e longa, nem consegui subir pedalando, tive que descer da bicicleta e empurrar. A bicicleta estava bem carregada e pesada. Sim, sou louco, não percebeu ainda? E fui continuando, subindo, subindo, sobe, sobe mais, mais um pouco, vai indo... Ok, agora tinha dois caminhos pela frente, sigo o pavimentado mais longo ou o de terra mais curto? E fui pelo mais curto. Ó senhores... Quase morrendo continuei subindo, empurrando a Nhanderecó, pois era impossível pedalar, talvez os relatos de possibilidade de fazer o percurso de bicicleta eram verdade no fator só bicicleta, não bicicleta carregada com alforjes, barraca e outras tralhas. Porque olha, não parava de subir mais, e tudo de terra e grama, nada de asfalto! Quase morto, só subida! Puta que o pariu!
E escorrega, quase me espatifo no chão várias vezes. Até um cavalo, dos vários que avistei na subida, ficou bravo comigo e quis me atacar, sei lá o por quê... Ficou agitado e relinchando! E sobe, sobe, pensei: - Sobe mais, é? Sim, sobe!
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O dia foi bem desgastante, Joseph tinha um ritmo bem forte, abaixava a cabeça e seguia pedalando no mesmo ritmo o percurso inteiro, na subida e na descida. A bicicleta dele tecnicamente era inferior à minha, mais leve também, mas nada que o impedisse de manter um ritmo rigoroso. Ele pedalava muito bem e eu ia seguindo na traseira dele, firme e forte. Me sentia bem, meu corpo reagia bem. Quando parávamos em alguma pequena vila e achávamos água na praça, era de uma alegria só, ambos igual garotinhos desfrutando do simples da vida.
Leon.
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Outro dia super produtivo e tranquilo no pedal. Fiz 100km num tiro só, saí às 7h30 e cheguei em León às 13h. Passei antes numa vila para carimbar meu passaporte e depois em León para almoçar e conhecer a cidade. Como tinha feito um bom e rápido tempo no percurso, decidi tirar 2 horas na cidade com calma. Pedalei pelo lindo centro de 2000 anos, vi as lindas catedrais e almocei um bife à parmegiana com batatas, cerveja e fechei com um cafezito. Respirei um pouco, verifiquei o mapa e o guia peregrino pra checar se estava no caminho certo e fui para a estrada novamente, para mais 37km até Hospital de Órbigo.
Hospital de Órbigo.
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Chegando na cidade, ou vilarejo (nunca sei como chamar), fui direto a um albergue seguindo placas pela rua e percebi uma movimentação maior do que a normal pelas redondezas, as ruas estavam enfeitadas com bandeiras medievais, algumas barracas e até no albergue os funcionários estavam trajados com roupas medievais. Foi quando descobri que toda aquela movimentação era por causa de um festival que iria começar. Festival que acontece todo primeiro final de semana do mês de junho na cidade para comemorar um evento do século XV conhecido como “El Paso Honroso”. Resumindo: um cavaleiro chamado Suero de Quiñones desafiou cavaleiros de toda a Espanha para um torneio de lanças Justas (sei lá o que é isso), pelo direito de cruzar a ponte da cidade. Durante um mês, ele e mais 9 amigos derrotaram cerca de 100 cavaleiros que ali estavam e os desafiaram, e depois continuaram em peregrinação até Santiago de Compostela.
Astorga.
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Fui seguindo caminho até Astorga, onde parei para comprar mantimentos no mercado e contemplar as obras do famoso arquiteto Antoni Gaudi e da belíssima catedral gótica de Santa Maria, do século XX, que levou 300 anos para ser construída.
Ponferrada.
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Havia lido em algum lugar (que confesso não me lembrar) que em Ponferrada tem um castelo templário, só que não havia visto nenhum castelo até então. Depois percebi que onde eu estava lanchando era praticamente o quintal do castelo, só que na parte de trás, digamos então que eu fiz uma parada templária. Bem, não é sempre que se come um pão com mortadela num quintal de um castelo templário, certo?
Villafranca del Bierzo.
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Segui por mais 21km e parei em Villafranca, me torturei para achar o albergue municipal, sério, sou muito ruim com mapas! Os albergues pelo Camino são super baratos, nunca paguei mais que 5 euros por um e os mesmos só estão disponíveis para peregrinos. Já instalado com o mesmo ritual "alberguiano", mas dessa vez consegui me enturmar mais com os outros peregrinos que lá estavam, mas não durava muito esse elo, eram conversas não muito longas e todos estavam muito cansados, a maioria estavam percorrendo o Camino caminhando, ou seja, enquanto eles andavam no máximo 30km por dia, eu fazia no mínimo uns 80km, portanto era “Oi hoje e amanhã Tchau”.
Santiago de Compostela.
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UFA! Cheguei. Confesso que achava que haveria fogos de artifício, pessoas na linha de chegada... nada, nem placa de parabéns havia, poderia ter algo motivacional ali, mas... fui pedalando, entre peregrinos e já perdido sem saber onde ir. Decidi seguir direto para mais um carimbo no passaporte, talvez o último na Espanha. Carimbado, fui atrás de onde pegar o certificado de chegada e finalização do percurso no centro de peregrinos, sim, tem um, e havia fila! Retirei o certificado - paguei, é claro - e nenhum fogo de artifício? Nenhum “uhul”? Nada? Nada! Ok, peguei a Nhanderecó e fui atrás de um abrigo e banho quente.
A famosa missa do Botafumeiro...
E seu órgão de filme de terror!
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